Certamente, nos últimos
50 anos, uma das maiores contribuições jurídicas neste país é a vigência da Lei
8.078 de 11 de setembro de 1990 (O Código de Proteção e Defesa do Consumidor –
CPDC) o que possibilitou a viabilidade de um consenso entre os limites do que
seria justo e vulnerável no campo do Direito. Tal diploma destaca com recatada
atenção sobre assistência médica e a relação entre o consumidor e o
profissional desta área, tendo sempre o cuidado de não abordar o tema saúde
como uma atividade mercantil, até mesmo pela importância que o Código
representa como balança de moderação e disciplina do relacionamento entre o
consumidor e o prestador de serviços.
De certo que não
estamos mais na época em que o médico exercia, de forma quase solitária e
espiritual, uma atividade junto a quem pessoalmente conhecia. Hoje ele é um
pequeno executivo que se rege por regras e diretrizes traçadas por uma elite
burocrática que tudo sabe e tudo explica. A Medicina-arte agoniza nas mãos da
Medicina-Técnica, como ensina o Professor Genival Veloso de França em seus
livros. A erudição médica vai sendo substituída por uma sólida estrutura
instrumental. Não podemos omitir o fato de a medicina atual ter tomado rumos
diferentes da de antigamente.
A sociedade, por sua
vez, também não ficou indiferente às mudanças. A capitalista-industrial,
utilitarista e pragmática, embasada em parâmetros de produção e consumo integra
em massas populares o ser-indivíduo, baseando suas relações por meio de
contratos. Tornam-se as mentes esfomeadas com os vertiginosos sucessos, em que
o homem começa a ser despersonalizado e desvalorizado como uma simples coisa,
inexpressivamente, colocado dentro dessa iludida realidade que ele próprio
criou e não pode mais controlar. Este pensamento instituiu uma modalidade de
medicina, em que o homem passou a ser um grande enfermo numa coletividade
alienada.
Há certas profissões,
e a Medicina é uma delas, que, por sua natureza e circunstâncias, são capazes
de gerarem danos a outrem. Cabe ao médico, por menos experiente que seja o
paciente e por mais ingênuo que este possa parecer, o dever de dar ciência do
risco gerado na tentativa de salvar uma vida ou restabelecer sua saúde. Mesmo o
mais tímido e discreto ato médico é passível de risco, ainda que sabendo de
suas obrigações. Esse é o preço que vem pagando os pacientes pelos mais
espetaculares progressos que a tecnologia tem emprestado à Medicina e assim tem
sido o tributo pago por todas as comunidades beneficiadas pela civilização
moderna.
O homem procura
sentir prazer na mesma proporção que evita sentir dor. Para alcançar isto busca
ajuda médica. Neste ponto está formada a relação médico-paciente, a qual se
busca o restabelecimento de um estado de saúde normal, pela ação de um esforço
do profissional contratado. Em caso de expressa declaração de um determinado
resultado, caberá ao médico proporcioná-lo ao paciente, podendo ser civilmente
e criminalmente responsabilizado.
Nunca é demais
mencionar que para a sociedade, além da má prática médica, existem outras
causas que favorecem um resultado adverso em um tratamento, como o
desconhecimento de cláusulas intrínsecas aos contratos, as péssimas condições
de trabalho e a penúria dos meios indispensáveis no tratamento das pessoas, a
ponto de num futuro próximo o Médico, ao se deparar com um paciente com gripe,
ouça primeiro seu Advogado para só depois concluir a consulta.
Curiosamente, os
pacientes não estão morrendo somente nas mãos dos médicos, mas nas filas dos
hospitais sem leitos, a caminho dos ambulatórios sem remédios, nos ambientes
miseráveis onde moram e na iniqüidade da vida que levam. Vendo este lamentável
cenário de trabalho é fácil entender o que vem acontecendo no exercício da
Medicina, onde se multiplicam os danos e as vítimas, e onde é cômodo culpar os
Médicos.
Por Carlos Luiz Zaganelli Filho , parceiro da Rede Scalzilli Brasil Corporate– Vitória - ES
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