A
Corregedora Nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, afirmou ontem que o
julgamento da ação penal do mensalão, que será iniciado no próximo mês,
colocará em xeque também a confiança da sociedade brasileira no Supremo
Tribunal Federal (STF). "Será um bom momento para se ter a ideia do que
representa o Supremo Tribunal Federal dentro de uma expectativa da sociedade.
Acho que há por parte da nação uma expectativa muito grande e o Supremo terá
também o seu grande julgamento com o mensalão, como ele se porta diante dos
autos. É neste momento que o Supremo passará a ser julgado pela opinião
pública", avaliou.
Para a
ministra, que proferiu em São Paulo palestra sobre a atuação da Corregedoria
Nacional de Justiça, "todo e qualquer poder no regime democrático também
se nutre da confiabilidade daqueles a quem ele serve". O resultado
prático, entende Calmon, é que mesmo o Supremo, que normalmente não se deixa
influenciar pela opinião popular, tem sentido a repercussão gerada pelo caso.
"Ele [o STF] sempre se manteve meio afastado, mas nós já começamos a
verificar que efetivamente já não é com aquela frieza do passado. Hoje eles têm
sim uma preocupação. O país mudou e a população está participando",
avalia. "Não porque a população esteja influenciada pela imprensa. A
opinião pública também está sendo formada pelas redes sociais. Ninguém está
fazendo a cabeça da população, ela é que se comunica entre si. Isso tem causado
a sensibilidade do STF", acredita.
A
possibilidade de desmembramento do processo para que os acusados sem foro
privilegiado sejam julgados pela primeira instância, questão de ordem que será
levantada pelo ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, defensor do
ex-diretor do Banco Rural José Roberto Salgado, e que o STF terá de decidir tão
logo inicie o julgamento, é motivo de preocupação da ministra. "Como juíza
criminal, creio que quando se faz essa divisão, se quebra a continuidade da
prova. O ideal é que sejam todos julgados pelo mesmo corpo de juízes. Não tenho
dúvida de que continuidade do julgamento em bloco, de todas as pessoas que
estão ligadas, é o mais benéfico.
Três réus do
mensalão dispõem de foro privilegiado por exercerem mandato parlamentar. O STF
já negou o pedido de desmembramento duas vezes, seguindo o entendimento da
denúncia apresentada pela Procuradoria Geral da República, na qual o caso é
visto como decorrente da atuação de uma "quadrilha" e a ação de um
réu não poderia ser compreendida por si só.
A ministra
também opinou sobre o direito de o Ministério Público fazer por conta própria
investigações criminais, questão cujo julgamento está suspenso no STF por conta
de um pedido de vista do ministro Luiz Fux. "Sou plenamente a favor do
poder investigatório do Ministério Público. Ele tem o poder de, ao examinar as
provas, verificar onde há a fragilidade e complementá-la. Não se vai quebrar a
perna do MP", cravou. Os ministros Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski
votaram pelo esvaziamento de tais poderes. O presidente do STF, ministro Ayres
Britto, já adiantou seu voto em favor da manutenção dos poderes do MP.
Em sua
palestra, Eliana Calmon falou das ações do CNJ como o programa "Pai
Presente", que busca estimular o reconhecimento de paternidade de pessoas
sem esse registro - e contra o qual foram impetrados dois mandados de
segurança, sem sucesso. Prestes a deixar o atual cargo, disse: "O cargo de
corregedora foi o que eu mais ambicionei em minha vida como magistrada".
Por Vandson Lima | De São Paulo
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